Dia da Consciência Negra

Hoje é celebrado o Dia da Consciência Negra. A data marca o dia da morte do grande Zumbi dos Palmares, em 1695.

Para não deixar passar a data o Blog Acesso Livre posta o poema "A História Que o Brasil Não Contou" da poeta mineira Cida Aráujo, do livro "Mulher, o axé criador". Esse escrito chegou até a Casa Brasil Vitória através da Giulliana de Souza, coordenadora da unidade Casa Brasil - Obra Kolping, de Belo Horizonte.


A História Que o Brasil Não Contou





















Pouco, me ensinaram, a escola e a sociedade sobre minha verdadeira história.
Sobre minhas raízes, realidade.
Ao me falarem da escravidão ressaltaram o poder dos senhores e a submissão do negro.

Falaram-me das correntes, do tronco, da chibata e dos porões...
Não me falaram da resistência, das lutas, da organização.
Deixaram margem para que eu pensasse que o povo negro era idiota, que aceitava tudo calado.

Ao me falarem das plantações de café, dos canaviais, das minas e dos casarões, não me falaram da sua força, da sua inteligência, da sua capacidade de fazer um país com a força de seus braços.

Chegaram a afirmar que o povo negro era preguiçoso. Só trabalhava para não apanhar.

Ao me falarem de sua identidade, contaram-me que eles chegavam aos montes, em navios negreiros,

Marcados a ferro como animais. Vendidos em feiras como mercadorias.
Não me falaram que o povo negro tinha alma, sangue, raízes.
Ao me falarem da sua fé, diziam apenas que eram supersticiosos, feiticeiros, cultuavam Deuses pagãos.

Não me falaram de sua religião, de sua fidelidade a um Deus vivo, cultuado com danças, cantos, gestos e rituais.

Não me falaram da alegria do povo negro ante o reconhecimento, que podiam contar com o senhor de todas as histórias.

Ao me falarem da beleza, definiram-na assim:
Ter traços finos, cabelos lisos e pele clara era ser bonito.
Ter traços fortes, cabelos crespos e pele escura era ser feio.
Não me falaram que o negro tem seu cheiro, sua característica.
Sua ginga, um olhar, um brilho especial.
Que o negro cabeça erguida, encanta.
Que o negro é lindo!

Ao me falarem da sua cultura... Aí, eu tenho vontade de chorar! Nada falaram.
Fizeram-me pensar que o povo negro era uma folha atirada ao vento
Não me falaram que o negro tem um sangue diferente. Sangue quente, nobre, forte e bonito

O regente de seu corpo, de sua cultura.
Uma energia que enobrece sua arte.
Que faz vibrar!
Que faz cantar!
Que faz dançar!

Que faz surgir sons especiais dos objetos simples e banais.
Falaram-me muito da Princesa Isabel.

Pouco, ou nada, de Zumbi dos Palmares.
Fizeram-me sentir tristeza por ser negra.
Fizeram-me sentir vergonha por ser negra.
Em meu corpo moreno, mulato, pardo, existe a pigmentação que define minha origem,
Em minha alma vibrante, meu espírito silencioso.
Em minhas veias vigorosas
Corre o sangue dos meus ancestrais.

Sangue africano!
Sangue baiano.!
Sangue mineiro!
Sangue negro.
A pigmentação que define a minha raça!
AXÉ!


Cida Araújo
para conhecer mais da autora e ler outros trabalhos: cidaaraujo2007poetisa.blogspot.com

(foto é de Pierre Verger, fotografo francês que dedicou como poucos a vida à retratar a cultura negra brasileira, hoje sua obra é mantida por uma Fundação que leva seu nome.)

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